As inspecções às importações destinadas à indústria estão a atrasar a saída dos contentores do Porto de Luanda. Empresários reconhecem que é preciso apertar fiscalização, mas dizem que não devem arcar com custos de sobre-estadia.
A Administração Geral Tributária (AGT) está a passar a pente fino os contentores com importações destinadas à indústria, e que beneficiam de isenções fiscais e taxas reduzidas, após terem sido constatadas várias irregularidades entre o manifesto de carga e os produtos importados.
O reforço das inspecções está a gerar atrasos de duas semanas na retirada dos contentores e os custos da sobre-estadia estão a ser imputados aos importadores, facto que está a gerar descontentamento entre despachantes alfandegários e transitários, que há semanas não têm mãos a medir para fazer sair contentores do Porto de Luanda.
“A AGT tomou a decisão, mas não viu se tinha pessoas suficientes para realizar inspecções generalizadas e, por isso, as inspecções estão a demorar mais de duas semanas”, adiantou um transitário ao Expansão.
Quanto um contentor chega ao Porto de Luanda tem direito a uma estadia de quatro a cinco dias. Findo esse período, se não for retirado, o porto cobra custos de sobre-estadia equivalentes a 90 USD por dia e no caso de ser necessário recurso a refrigeração os custos disparam para os 450 USD diários.
Uso indevido de isenção
Idalécio Cardoso, técnico da Direcção dos Serviços Aduaneiros da AGT, adiantou que as “inspecções às mercadorias com isenção de direitos e mais imposições é um processo contínuo” que visa “garantir a aplicação dos códigos de isenção, bem como do benefício concedido pelo Estado”. E abrangem não só as mercadorias com fins industriais, mas todas as que são “sujeitas à apresentação de declaração de exclusividade”, ou seja, aquelas que “carecem de autorização prévia do órgão de tutela”.
As irregularidades detectadas, segundo Idalécio Cardoso, estão relacionadas com o “uso indevido do código de isenção, classificação pautal incorrecta, a não submissão de declaração de exclusividade e nalgumas situações a disponibilização da mercadoria em data posterior à da tramitação da declaração aduaneira, o que contraria o disposto no artigo.º 18 do Código Geral Tributário”, uma vez que “não se verificam na altura os pressupostos legais para usufruto do benefício”.
Um transitário, estranha que só agora é que haja um apertar das inspecções às importações, um procedimento normal em qualquer porto no mundo. Há muito que se fala em abusos e irregularidades nas importações e na existência de empresários que beneficiam de isenções em produtos que passam por matéria-prima e maquinaria, mas que na realidade não são.
Há também quem importe carros, e outros bens, com valor muito inferior ao do mercado onde foi adquirido, para pagar poucos direitos, segundo avançou um transitário ao Expansão.
A moldura penal abstracta para os infractores, segundo Idalécio Cardoso, varia entre os 6 meses a 3 anos de pena de prisão ou multa de duas a três vezes o valor dos direitos e demais imposições aduaneiras, nos termos da alínea d), do artigo 177, Código Geral Tributário.
Quanto às queixas dos despachantes, transitários e empresários sobre a demora na emissão das notas de remoção – documento que permite a retirada dos contentores do porto – o técnico da Direcção dos Serviços Aduaneiros da AGT informa que o contribuinte, ou seja o empresário-importador, pode “solicitar por intermédio de um termo de responsabilidade a remoção da mercadoria para um local por si indicado, permitindo assim a redução do custo de armazenagem, desalfandegamento célere da mercadoria e a inspecção passa a ser feita no armazém do importador”.
Pagar o justo pelo pecador
Idalécio Cardoso sublinha que estes constrangimentos penalizam sobretudo os incumpridores, já que os processos de fiscalização são feitos com base em resultados. Assim, “sempre que se verifica que o contribuinte é cumpridor, automaticamente sai do perfil de risco passando a ser monitorado sem a recorrência habitual”. No último mês, contudo, não é o que se verifica.
Até aqui, só eram assinalados a vermelho, para inspecção, os contentores provenientes da China e aleatoriamente alguns de outra proveniência. Há perto de um mês, praticamente nenhum importador ligado à indústria, independentemente da origem da mercadoria, escapa ao crivo da AGT, o que está a gerar atrasos e custos acrescidos para os empresários.
Caso a situação se mantenha por muito tempo, a Associação das Indústrias de Materiais de Construção de Angola admite contactar o Ministério da Indústria, para analisar formas de minimizar o impacto destas inspecções, porque há empresas que não se podem dar ao luxo de esperar duas semanas para que a matéria- -prima saia do Porto de Luanda.
Como refere um empresário, todos sabem que há abusos, mas não pode “pagar o justo pelo pecador”. Por isso, propõe que, no final da inspecção, e caso se confirme que está tudo em ordem, os custos de sobre-estadia não sejam imputados ao importador. Só assim, saem todos a ganhar.
Expansão