O contexto económico, as medidas impostas pelo Banco Central desde 2018 e a cada vez maior utilização de cartões internacionais provocou um rombo enorme a uma actividade que já deu cartas no País. Os perigos associados ao branqueamento de capitais são um enorme entrave.
Já foram grandes centros de movimentação de divisas e rivalizavam (em parte) com o mercado informal, sobretudo nos movimentos para o exterior do País. Mas desde o início da crise económica, em 2014, depois rematada pela reforma cambial, com novas regras de regulação e pela pandemia, que o número de casas de câmbio em funcionamento tem vindo a diminuir de forma acentuada.
O Expansão visitou três casas de câmbio (também autorizadas a efectuar remessas de dinheiro para outros países) que actuam em Luanda e o cenário é de “calmaria”, apesar dos funcionários garantirem que a procura por aquele tipo de serviços continua a ser elevada.
Uma das empresas actua no município de Talatona , por volta das 13 horas de terça-feira, dia 14, em pleno horário de trabalho, não tinha qualquer cliente no interior das suas instalações – um cenário totalmente distinto do que se verificava no auge do crescimento económico pós-2002.
Também já não são visíveis no exterior destes estabelecimentos as enormes movimentações de agentes informais de câmbio de divisas (chamados popularmente por kinguilas), típicas de uma economia pós-conflito em forte expansão.
O zeloso funcionário explicou que não tinham divisas disponíveis e que também não conseguia dar uma previsão concreta “apesar da elevada procura”. “A qualquer momento pode entrar um cliente que nos vende moeda estrangeira”, sublinhou, para depois explicar que as remessas de dinheiro ficam concluídas em apenas 48 horas. Apesar de tudo, um ganho face ao tempo que costumam demorar na banca.
As remessas, aliás, parecem ter ainda alguma procura junto das empresas não financeiras autorizadas a prestar este tipo de serviços. Já no aeroporto, apesar das centenas de pessoas que por ali circulavam ou esperavam a hora do embarque, os serviços de câmbio estavam sem movimentação de clientes.
A funcionária de uma das principais casas de câmbio do País, garantiu que havia disponibilidade de divisas (dólares norte-americanos). “Também fazemos transferências para Brasil e Portugal. Se for para uma conta bancária, demora 48 horas. Se for para o dinheiro ser recolhido ao balcão, a transferência é efectuada na hora”, explicou.
Na zona dos Combatentes, uma das áreas com maior actividade comercial no centro de Luanda, um funcionário de uma empresa autorizada pelo Banco Nacional de Angola (BNA) a prestar serviços de câmbio e remessas, confessou que já não efectuam operações desse género. “Neste momento temos disponível apenas o serviço de envio de remessas”, garantiu. O operador disponibiliza remessas em 48 horas para Brasil, Cabo Verde, China, Emirados Árabes Unidos, EUA, Filipinas, Portugal, Turquia, Vietname, África do Sul e Índia.
Cada vez menos operadores
A depressão ao nível das casas de câmbio não se verifica apenas no dia-a-dia. Os números são também esclarecedores: das 121 empresas registadas até final de 2017, apenas resistiam, três anos depois, 49, com 72 operadores a não resistirem à crise económica e ao novo regulamento de obtenção de divisas através da banca comercial.
Em termos práticos, os bancos receberam instruções para comercializar divisas às casas de câmbio e aos prestadores de serviços de pagamento, através do instrutivo n.º 15/18 de 19 de Novembro, com uma margem de lucro (spread) não superior a 2% da taxa oficial do BNA. Ou seja, se antigamente as casas de câmbio podiam comprar divisas directamente ao banco central, desde Novembro de 2018 que esta possibilidade foi-lhes retirada.
Actualmente, de acordo com o site do BNA, estão autorizadas 34 casas de câmbio. Entre elas, 27 entidades podem também exercer actividade de remessa de valores.
Apesar da reforma cambial ter introduzido medidas que foram de encontro às reivindicações da Associação das Casas de Câmbio, as práticas associadas ao branqueamento de capitais também forçaram mudanças na regulação. Mesmo assim, os riscos ainda permanecem elevados.
Segundo a Unidade de Informação Financeira (UIF), na Avaliação Nacional de Risco de 2019, publicada em 2021, nas remessas de valores “foram identificadas várias fragilidades”, nomeadamente no que se refere à “falta de efectivo conhecimento do beneficiário final e a inadequada aplicação dos institutos de due diligence”.
Também na análise sobre a actuação das Outras Instituições Financeiras Não Bancárias (OIFNB), a UIF afirma que “tendo em conta as vulnerabilidades identificadas”, conclui-se que as casas de câmbios “se caracterizaram como sendo as instituições do sector que apresentam os riscos mais altos, enquanto as sociedades de remessas de valores, sociedades de microcrédito e cooperativas de crédito apresentam riscos relativamente baixos”.
Expansão