A dívida pública angolana já ultrapassa os 60 mil milhões de dólares, com a componente externa a representar mais de 70% do total.
O Governo garante estar a aplicar um plano de “higienização” para desconcentrar os prazos de reembolso, enquanto tenta responder à pressão dos empresários nacionais, que clamam pelo pagamento dos atrasados.
A discussão aconteceu no Angola Economic Fórum 2025, em Luanda, onde o Executivo reiterou o compromisso com a transparência e a sustentabilidade da dívida pública.
O stock global da dívida pública angolana ronda actualmente os 60 mil milhões de dólares norte-americanos (equivalente a 51,6 mil milhões de euros), sendo que a dívida externa representa cerca de 45 mil milhões de dólares (38,7 mil milhões de euros), informou nesta quarta-feira o Director-Geral da Unidade de Gestão da Dívida Pública (UGDP), Dorivaldo Teixeira.
Segundo o responsável, a dívida externa tem hoje um perfil de maturidade mais alargado, com um prazo médio de reembolso a nove anos, contrastando com a dívida interna, cuja maturidade ainda é considerada “residual”, com três anos em média.
“Estamos a conduzir um processo de higienização da dívida pública para desconcentrar os seus vencimentos, sobretudo no curto prazo. Esta concentração é um dos maiores riscos fiscais e temos vindo a diluí-lo de forma gradual”, afirmou Teixeira, à margem do Angola Economic Fórum 2025 (AEF2025), que decorre em Luanda.
Ainda segundo o Director-Geral da UGDP, esta reestruturação permitiu elevar a maturidade da dívida interna de dois para três anos nos últimos anos, fruto da aplicação de novos instrumentos e maior previsibilidade orçamental.
Juros, atrasados e calendário de pagamentos
O responsável garantiu ainda que o processo de redução das taxas de juro da dívida interna continuará a ser gradual, estando condicionado à redução da inflação e ao reforço da capacidade de tesouraria do Estado.
Relativamente à liquidação da dívida interna, Teixeira afirmou que o processo decorre segundo um cronograma previamente definido, que inclui a certificação pela Inspecção-Geral da Administração do Estado (IGAE). Para o ano em curso, foi estipulado um plafond anual de 300 mil milhões de kwanzas (cerca de 283 milhões de euros).
“Até Agosto de 2025, já liquidámos mais de metade desse valor. A nossa prioridade tem sido o pagamento das dívidas de menor dimensão para garantir maior abrangência no mercado empresarial”, explicou o dirigente.
Pressão por auditorias e transparência Fiscal
Questionado sobre a recorrente proposta de auditoria pública à dívida nacional, frequentemente defendida por sectores da sociedade civil e da oposição política, Dorivaldo Teixeira considerou legítima a exigência por maior transparência, mas sublinhou que a UGDP tem actuado nesse sentido.
“Publicamos regularmente o Plano Anual de Endividamento e boletins trimestrais com dados desagregados, precisamente para reforçar a confiança dos cidadãos e investidores”, sublinhou, garantindo que os esforços já têm dado resultados visíveis.
ANÁLISE EDITORIAL
A revelação do estado actual da dívida pública angolana, com particular destaque para a maturidade da dívida externa, oferece ao mercado sinais positivos de que o Executivo procura mitigar os riscos de refinanciamento de curto prazo, o que é estratégico num ambiente global ainda marcado por incertezas cambiais e fiscais.
Contudo, a pressão dos credores internos — sobretudo empresas nacionais com créditos em atraso — expõe uma tensão entre gestão macroeconómica e sobrevivência empresarial, que pode ter impacto directo na geração de emprego e no ambiente de negócios.
A aposta na “higienização” da dívida é técnica e financeiramente acertada, mas carece de forte componente comunicacional e maior visibilidade pública, para contrariar as suspeitas de opacidade que pairam sobre a governação fiscal em Angola. A defesa activa de uma auditoria externa ou independente poderia ser o próximo passo para consolidar a credibilidade institucional neste domínio sensível.