Estão aí novos investimentos e financiamentos vindos dos EUA, mas há diversos constrangimentos que limitam a entrada de novos operadores. Especialistas defendem que Angola deve focar-se no sector privado americano e nas médias empresas que queiram expandir-se para os diferentes mercados africanos.
Os interesses norte-americanos em Angola sempre foram intensos, mas depois de 1990 (e do fim da Guerra Fria) concentraram-se sobretudo no sector petrolífero, onde as empresas americanas têm grande relevância desde o período colonial. Agora, durante os governos liderados por João Lourenço, verifica-se uma aproximação inédita motivada por factores económicos, por uma nova organização política internacional forjada no conflito Ucrânia-Rússia, mas sobretudo pelo surgimento de actores globais como a China e a Índia.
Desde 2017, cerca de 7.000 milhões USD (ver tabela) foram ou estão em vias de ser mobilizados para Angola via empresas, financiamentos e parcerias com entidades norte-americanas, embora apenas dois projectos sejam considerados Investimento Directo Estrangeiro (IDE): a refinaria do Soyo, avaliada em 3.500 milhões USD e que envolve a participação de empresas angolanas no consórcio Quanten (uma entidade de origem americana), e a Africell, a terceira operadora de telecomunicações do País, que investiu 300 milhões USD só para arrancar com a sua actividade em Angola.
Esta nova aproximação verifica- -se também ao nível dos financiamentos, um mecanismo que tinha sido monopolizado pela China desde 2002, sendo que apenas para a construção de centrais de energia fotovoltaicas (na modalidade de projecto chave-na-mão) foram destinados cerca de 2.000 milhões USD, que estão a ser geridos por uma empresa que também é de origem norte-americana (Sun Africa).
Mas o grande símbolo desta nova vida yankee em Angola é mesmo o Corredor do Lobito, que tem motivado inúmeras e surpreendentes declarações públicas de Joe Biden, inclusive durante a última reunião do G7 no Japão e noutros comunicados oficiais.
Lobito, centro do mundo
O corredor originou, a partir do Lobito (cidade que se arrisca a tornar num palco real da luta entre actores globais), um despique entre os EUA e a China, que também agilizou empresas e interesses próprios para obter a concessão do caminho-de-ferro de Benguela (atribuída a uma parceria que envolve a Trafigura, multinacional de origem suíça, e empresas belgas e portuguesas) e do porto mineiro.
Neste último caso, apesar de ter sido vencedor do concurso público, o consórcio composto pela China International Trust Investment Corporation (CITIC) e Shandong Port Group (SPG) acabou por se retirar naturalmente do negócio quando percebeu que a concessão para o caminho-de-ferro tinha caído para o lado ocidental.
Ou seja, desde 2017 que os interesses americanos em Angola saíram do petróleo e assentaram na geração de energias limpas, nos transportes, telecomunicações e ambiente, sectores que estão claramente no topo da agenda internacional dos EUA e do governo de Joe Biden.
É agora que a economia angolana, com o suporte dos EUA e das suas próprias agendas, vai diversificar-se e quebrar a hegemonia do petróleo? Not so fast (ou calma, em português), como diriam os próprios americanos.
Para o economista e investigador da Universidade Agostinho Neto, Fernandes Wanda, a governação angolana e “alguma comunicação social (incluindo também analistas) parece não ter noção que nos Estados Unidos o sector privado é que influencia a actuação do governo”.
“O Governo americano trabalha para o sector empresarial privado e para os cidadãos. Por outras palavras, lá o Governo trabalha para os contribuintes”, frisa o académico angolano, que sublinha que Angola precisa inicialmente de definir os sectores onde gostaria de atrair investimentos, para depois identificar empresas americanas de média dimensão interessadas em expandir as suas operações para África, criando condições para atraí-las.
“Enfim, a atenção deve ser dada ao empresariado americano e não ao governo americano”, considera Fernandes Wanda. São argumen[1]tos similares aos do empresário angolano Pedro Godinho (Prodoil, Grupo Veleiro), que também é presidente da Câmara de Comércio Americana em Angola. “Precisamos de nos organizar e desenhar projectos que possam ser financiados pelos EUA. Somos nós que temos de fazer este trabalho”, ressalva o investidor e gestor angolano.
“Nos últimos tempos, passaram por Luanda altos dirigentes de instituições financeiras americanas. Isto significa que, nesta altura, eles já têm as informações e as perspectivas todas sobre Angola, sobre o potencial, o que pode valer a nossa economia. Então somos nós que temos de concretizar estas possibilidades”, defende Pedro Godinho.
Expansão