Execução das despesas passa a ser limitada ao tecto disponível para qualquer unidade orçamental. Não se vai mexer nas despesas prioritárias, como salários, protecção social, subsídios, limpeza e saneamento, construção e reabilitação de estradas. Especialistas defendem que a medida veio tarde.
Depois de o Presidente da República, João Lourenço, autorizar a ministra das Finanças, Vera Daves, a cativar as despesas de actividade básica e de apoio ao desenvolvimento até 50%, desde que não sejam consideradas despesas prioritárias, o Ministério das Finanças (MinFin) prevê cativar despesas num valor a rondar entre os 2,4 biliões Kz e os 2,7 biliões. Trata-se de um valor equivalente a 13% do Orçamento Geral do Estado 2023.
Contas feitas, o Orçamento que estimava receitas (e também despesas) de 20,1 biliões Kz passa a ser de pouco mais de 17 biliões, se forem cumpridas as estimativas do MinFin. O OGE 2023 projecta ainda receitas fiscais na ordem dos 13,4 biliões Kz e 6,6 biliões de financiamentos internos e externos.
Entretanto, as coisas não têm corrido tal como se perspectivou. Isto porque no primeiro semestre Angola exportou menos 17 milhões de barris de petróleo (devido a paragens para manutenção nos principais blocos), o que contribuiu para a queda das exportações e consequente afundanço na captação de receitas fiscais petrolíferas.
O Estado arrecadou 2,9 biliões Kz em receitas fiscais petrolíferas no I semestre, o que representa apenas 40% do total de 7,2 biliões Kz previstos para o ano todo. Associado a este cenário, está o facto de nos mercados internacionais os juros estarem hoje em níveis incomportáveis para a sustentabilidade da dívida angolana, não permitindo a captação de financiamentos externos, o que significa que o Estado está sem dinheiro e teve de “travar a fundo” na despesa, cortando, sobretudo, em investimentos.
Caso não houvesse este corte na despesa, segundo o MinFin, o País enfrentaria uma derrapagem orçamental na ordem dos 7,4 biliões Kz, conforme foi anunciado em Julho pelo secretário de Estado para as Finanças e Tesouro, Ottoniel dos Santos. “Contudo, até ao final do ano, espera-se um cenário com um quadro fiscal melhorado, como resultado da implementação de algumas medidas do lado da despesa (cativação), bem como melhoria nas perspectivas de arrecadação”, de acordo com a resposta do gabinete de comunicação do MinFin a questões do Expansão.
Medida tardia, admitem os especialistas
No entanto, especialistas consideram que a medida já vem tarde. Para o economista e pesquisador Fernandes Wanda, a medida “peca por vir tarde já que estamos no final do ano”, e é apresentada depois de certas despesas que tinham sido “proibidas”, como a compra de viaturas para os deputados e cargos de chefia na função pública.
“O Governo prometeu e até procurou fazer consolidação fiscal (alinhar as despesas às receitas) particularmente quando vigorava o programa de Financiamento Ampliado do FMI, mas hoje vemos que essa consolidação fiscal não foi seguida à risca”, sustentou. Assim, para Fernandes Wanda, se o País chegou até este ponto é porque não houve uma aposta séria e sustentável na dinamização da produção como um todo e particularmente no sector alimentar. Ao invés disto, viu-se aumentar as importações incluindo aquelas que serviram para criar a Reserva Estratégica Alimentar, lamenta.
O mesmo pensamento defende o economista e consultor Sabino Conceição, ao argumentar que apesar de ser um processo com um ajuste fiscal pouco consolidado, é até provável que as cativações ultrapassem o montante avançado pelo Governo.
Assim, para Sabino Conceição, o Governo deve aprender a lição dos “erros da gestão” orçamental de 2023, já que com o actual “ambiente macroeconómico tempestivo” não há muito a fazer no actual. O foco nesta última parte do ano deve ser priorizar de facto os compromissos assumidos com os sectores que mais impactam na vida da população vulnerável”, rematou.
Expansão