No penúltimo leilão de divisas do Banco Nacional de Angola, a 24 de Janeiro, o Banco BIC beneficiou de 16 milhões de dólares para as operações de fixing.
Desta verba, mais de dois milhões e 500 mil dólares foram parar às contas de quatro empresas do presidente do Conselho de Administração do Banco BIC, Fernando Leonídio Mendes Teles.
E dali transferidas maioritariamente para Portugal, bem como para o Reino Unido e Itália.
Segundo apurou o Maka Angola, três das empresas beneficiárias são a Anglopig, Lda., a Tecnopig, Lda. e a Agro-Quibala, Lda., todas criadas a 15 de Novembro de 2013.
As três empresas têm a mesma estrutura accionista, com Fernando Teles a deter 80 por cento do capital em cada uma delas, enquanto a sua esposa, Maria Laurentina Almeida e Silva Teles, detém os restantes 20 por cento.
Por último, a Agrozootec, Lda., criada a 23 de Setembro de 2010, é detida em 80 por cento por Hugo Silva Teles, filho de Fernando Leonídio Mendes Teles, que por sua vez é administrador executivo e membro do Conselho de Administração do Banco BIC.
Estrutura de accionaistas do Banco BIC
Fernando Teles, detentor de dupla nacionalidade, angolana e portuguesa, é o segundo maior accionista do Banco BIC, com 37,5 por cento das acções.
A filha do ex-presidente José Eduardo dos Santos, a bilionária Isabel dos Santos, é a principal accionista da instituição bancária, possuindo 42,5 por cento do capital.
O Banco BIC também opera em Portugal, com a mesma estrutura accionista, e tem Fernando Teles como membro do seu Conselho de Administração.
As quatro empresas, conforme informações apuradas pelo Maka Angola, a partir de Portugal, transferiram grande parte das divisas que lhes foram alocadas pelo Banco BIC para a empresa portuguesa FTPGM (Fernando Teles e Pedro Garcia Matos) Lda.
Fernando Teles é sócio-gerente da referida empresa, em parceria com Pedro Miguel Martins Coimbra Garcia Matos.
“Não me parece estar bem informado”, responde Fernando Teles às questões que lhe foram enviadas pelo Maka Angola, por mensagem, sobre a alocação de divisas às suas empresas.
Para além de nos convidar para um encontro, Fernando Teles avança o seguinte: “Se visitar o projecto agrícola, vai verificar trabalho sério e constatar que os angolanos, como eu, devem investir para aumentar a produção nacional.”
Uma das prioridades do governo de João Lourenço, em relação à política cambial, tem sido facilitar a importação de alimentos e a sua produção.
E as leis e as regras?
Mas vejamos o cumprimento dessa política cambial e das regras de administração bancária.
Sabe-se que Angola atravessa uma crise cambial, e desde há muito os seus bancos perderam a credibilidade do sistema financeiro internacional, devido ao facto de servirem para financiar os interesses privados dos seus donos, bem como para branquear capitais.
O advogado Benja Satula cita a Lei de Bases das Instituições Financeiras (Lei n.º 12/15, de 21 de Abril), que exige um comportamento neutral e leal por parte da administração de um banco face aos seus clientes.
“Estamos perante a violação da lei (artigo 71.º), porque o banqueiro celebra negócios consigo próprio.”
Quantos clientes do Banco BIC estariam nas mesmas e iguais condições que as empresas de Teles, não tendo contudo beneficiado da moeda estrangeira leiloada?
Há um claro favoritismo do Banco BIC, que pertence a Fernando Teles, às empresas também detidas por Fernando Teles.
Depois, e talvez mais grave, o comportamento descrito surge em clara contravenção do Instrutivo n.º 2/2018, de 19 de Janeiro, emitido pelo governador do Banco Nacional de Angola (BNA), José de Lima Massano.
Esse Instrutivo determina que os participantes no Mercado Cambial devem agir de forma justa e transparente nas negociações com os seus clientes e outros participantes do mercado.
O documento do BNA responsabiliza os Conselhos de Administração pela promoção de valores e comportamentos éticos, assegurando de forma pró-activa a sua incorporação na cultura da instituição, designadamente para evitar conflitos de interesse.
Segundo o mesmo Instrutivo, a inobservância desses princípios poderá acarretar a aplicação de multas e a perda da autorização para realização de operações cambiais.
De acordo com Benja Satula, o comportamento de Fernando Teles “é um conflito de interesses que viola descaradamente” este Instrutivo do governador do Banco Nacional de Angola.
Finalmente, conforme leitura do Maka Angola, também é desrespeitado o Código de Conduta do próprio Banco BIC, designadamente os artigos 17.º e 28.º, o primeiro sobre conflitos de interesses, o segundo sobre “Chinese walls” (termo comercial que descreve as barreiras de informação dentro de uma organização que são erguidas para impedir trocas ou comunicação que possam levar a conflitos de interesse).
Isto é, as próprias regras internas da instituição bancária são respeitadas.