Ajayi Joshua Oluwatobi, antigo quadro sénior da Mercedes-Benz na Nigéria, está a liderar uma revolução silenciosa na indústria automóvel africana ao construir a NORD, uma das primeiras marcas de viaturas montadas por africanos e para africanos. Com mais de 20 mil unidades montadas anualmente, a marca começa a ganhar terreno num mercado historicamente dependente de importações.
Em vez de seguir uma carreira consolidada numa das maiores fabricantes de viaturas do mundo, o jovem nigeriano Ajayi Joshua Oluwatobi apostou num sonho pouco comum no continente africano: criar uma montadora automóvel 100% africana. Assim nasceu a NORD Automobiles, uma marca nigeriana que desafia gigantes como Toyota, Hyundai e Mercedes-Benz, com viaturas montadas localmente, pensadas para o contexto africano e a preços acessíveis.
A ousadia de Oluwatobi ganhou força após a crise económica de 2016, quando a desvalorização da moeda nigeriana naira levou à quebra da procura por viaturas de luxo. “De repente, ninguém conseguia comprar veículos novos. Era preciso mudar o jogo”, declarou o empreendedor à Business Insider Africa.
De executivo da Mercedes a fundador da Nord
Oluwatobi começou a sua carreira na divisão de viaturas da Mercedes-Benz Nigeria, tendo depois assumido a liderança da Jetvan. Durante esse período, conquistou o prémio de melhor desempenho em vendas da marca na África, ao aumentar a quota de mercado de 1% para 7%. Mas foi com a fundação da NORD, em 2018, que entrou definitivamente para o mapa da indústria africana.
Hoje, a NORD monta viaturas robustas, funcionais e com designe moderno, a partir de Lagos, e já exporta para o Gana, Costa do Marfim e Egipto.
A batalha contra o preconceito do “feito fora é melhor”
Apesar do avanço, a NORD enfrenta resistência cultural e comercial. A preferência por viaturas usadas importadas — mesmo com valores inflacionados — ainda domina a mente de muitos consumidores nigerianos.
“O problema não é só económico. É psicológico. Muitos preferem um Toyota usado a um NORD novo”, lamenta Oluwatobi.
Com viaturas vendidas a cerca de 11 mil dólares (valor muito inferior ao praticado por marcas internacionais na Nigéria), a NORD desafia o paradigma e coloca sobre a mesa uma alternativa economicamente viável e estrategicamente soberana.
O papel do Estado e o custo da dependência externa
A indústria automóvel nigeriana consome mais de ₦ 1 trilião de nairas por ano em importações de viaturas (mais de USD 670 milhões de dólares). Este montante representa divisas drenadas, empregos perdidos internamente e uma pegada ambiental agravada pela importação de veículos em fim de vida útil.
Oluwatobi defende uma política industrial mais agressiva: incentivos fiscais, linhas de crédito ao consumidor e quotas obrigatórias de aquisição estatal de viaturas locais.
“Comprar viaturas importadas é financiar fábricas estrangeiras com dinheiro africano”, alerta.
A proposta tem paralelo com os Estados Unidos e México, que recentemente impuseram tarifas de 100% sobre veículos eléctricos chineses, numa tentativa de proteger suas indústrias locais.
Ambição africana: produzir 100 mil viaturas por ano
A NORD conta actualmente com duas fábricas em Lagos e tem capacidade instalada para montar 20 mil viaturas por ano, com possibilidade de escalar para 100 mil unidades, caso existam estímulos de mercado. Entre 32% a 40% das componentes já são fabricadas localmente, com destaque para peças plásticas e grelhas frontais.
Mesmo com este avanço, a demanda interna na Nigéria é de cerca de 720 mil viaturas por ano, segundo dados dos EUA, o que demonstra o enorme espaço para crescimento das marcas africanas.
Análise Editorial | Correio Digital
A história de Oluwatobi é mais do que inspiradora — é estratégica. Num continente que importa quase tudo o que consome, produzir localmente é um acto de soberania económica e de visão de futuro.
Angola, tal como a Nigéria, é altamente dependente de viaturas importadas — maioritariamente usadas e com impacto ambiental e económico negativo. O exemplo da NORD revela um caminho possível: criar indústrias automóveis locais, adaptadas à realidade africana e impulsionadas por políticas públicas firmes.
Não basta celebrar a inovação nigeriana. É preciso aprender com ela. Angola precisa repensar as suas políticas industriais, estimular o crédito automóvel local, apoiar empreendedores visionários e apostar na criação de valor no território.
A indústria automóvel pode ser um motor de diversificação económica. Mas, para isso, o país precisa deixar de ser apenas consumidor e começar a ser também produtor.