Depois de quase dois anos em terreno positivo, a actividade industrial voltou a cair no I trimestre deste ano. E o cenário deverá ser pior no II trimestre já que o recurso às importações de bens intermédios vai ser fortemente prejudicado pela forte desvalorização cambial do Kwanza face ao dólar e ao euro.
A actividade industrial em Angola caiu 6,2% no I trimestre deste ano face ao mesmo período de 2022, depois de sete trimestres consecutivos em terreno positivo, influenciada pela queda da produção de 10,3% nas indústrias extractivas, que valem 87,2% do Índice de Produção Industrial (IPI) divulgado pelo Instituto Nacional de Estatísticas (INE).
De acordo com cálculos do Expansão, com base nos dados divulgados pelo INE, é a maior queda em pouco mais de quatro anos já que é preciso recuar ao IV trimestre de 2018, quando o indicador se fixou nos -7,3%, para encontrar um desempenho homólogo tão negativo do IPI.
O índice avalia a variação da produção industrial de quatro sectores, nomeadamente as indústrias extractivas, transformadoras, distribuição de electricidade e captação e distribuição de água. A queda de 6,2% do indicador, de acordo com os especialistas e industriais, é consequência da queda de produção de petróleo em alguns poços no País durante o período em análise.
Só para se ter uma ideia, Angola exportou menos 6,3 milhões de barris entre o I trimestre deste ano e o mesmo período do ano passado, o que acabou por se traduzir numa queda de 34% nas receitas fiscais do País, passando de quase 2,1 biliões Kz entre Janeiro e Março de 2022 para quase 1,4 biliões Kz. Contas feitas, foram menos 708,2 mil milhões Kz que entraram nos cofres do Estado.
Segundo os especialistas, a este cenário de queda da produção de petróleo acresce também a redução de investimentos na indústria, perspectivando-se, desde já, um cenário pouco animador para o sector industrial angolano já que só no II trimestre o Kwanza já depreciou 39% face ao dólar, o que tem como principais consequências prejudicar a importação de matérias-primas para a produção industrial.
“Tudo isto está ligado à dependência da produção e exportação de petróleo”, disse ao Expansão o investigador da Universidade Agostinho Neto, Fernandes Wanda, que não tem dúvidas que vêm ai tempos difíceis não só para as famílias mas também para a indústria nacional, sobretudo a que depende de importações de bens de capital e de consumo intermédio.
Para contornar estas dificuldades, fontes do Expansão defendem mais incentivos às iniciativas empresariais do País. Por outro lado, prosseguiu outra fonte, o Estado não deve continuar a exercer o papel de empreendedor é preciso envolver mais a iniciativa privada.
Dentro das indústrias extractivas, cuja produção global caiu 10,3%, destaque para o afundanço de 10,6% na extracção de petróleo e para o ténue crescimento de 0,1% na extracção de diamantes nos primeiros três meses do ano. No caso do subsector dos diamantes, o crescimento deveu-se à entrada em operações de novas minas, como é o caso do Luele e o aumento dos investimentos na exploração de diamantes.
Por outro lado, a empurrar a produção industrial para cima esteve a a indústria transformadora, sendo o sector que mais cresceu no I trimestre de 2023 face ao mesmo período de 2022. Destaque vai para a subida na fabricação de pastas de papel, edição e impressão (8,0%), seguida pela indústria alimentar (7,7%), da produção nas Indústrias das bebidas e do tabaco (5,1%), na fabricação de têxteis (4,0%) e na fabricação de mobílias (3,7%). Ainda dentro da indústria transformadora, pela negativa esteve a fabricação de produtos petrolíferos, químicos e outros, já que registou um crescimento negativo de 7,6%, enquanto a fabricação de máquinas derrapou -2,9% durante o período em análise.
A queda que se registou na indústria transformadora é atribuída à falta de matérias-primas e às frequentes avarias mecânicas nos equipamentos, acrescentando também as dificuldades de acesso aos financiamentos, falta de mão-de-obra especializada nacional e da falta de electricidade e água em algumas unidades que muitas vezes são obrigadas a recorrer às fontes alternativas para o exercício da sua actividade. Por norma muito mais caras.
Em contraciclo com a realidade industrial do País apresentada pelo INE, o ministro da Indústria e Comércio, Victor Fernandes disse há duas semanas em Benguela que o País tem tudo para atrair mais investimentos para o sector e justifica: “há facilidade de acesso à terra, existe força de trabalho constituída na sua maioria por jovens.”
O governante, citado pelo Jornal de Angola adiantou que o País tem actualmente um “excelente” ambiente de negócios, facto que é desmentido não só pelos diversos índices e relatórios internacionais sobre o País, mas também por especialistas e economistas não só nacionais mas também estrangeiros e até embaixadores. E até pelo próprio, quando em Grande Entrevista ao Expansão, publicada no final de Fevereiro, afirmou que “Eu estaria errado se afirmasse que o ambiente de negócios em Angola é, nesta altura, o melhor para o investimento estrangeiro.
Expansão