Um processo de sindicância à Ordem dos Contabilistas propõe a expulsão do presidente do Conselho Directivo, do vice-presidente e de um vogal, por usurpação de poderes e improbidade pública que conduz ao enriquecimento ilícito. Só o presidente e o vice ganhavam mais de dois milhões Kz por mês, cada.
Usurpação de poderes e actos de improbidade pública, como a atribuição de salários num montante global superior a 105 milhões Kz a três membros da direcção, ao arrepio dos estatutos e sem a aprovação dos órgãos sociais competentes, estão na base do pedido de perda de mandato do presidente, Manuel Ribeiro, do vice-presidente, Alberto Seixas e de Eduardo Nvovi, vogal-secretário do Conselho Directivo da Ordem dos Contabilistas e Peritos Contabilistas de Angola (OCPCA).
Sobre Manuel Ribeiro pende também a ameaça de “acção penal pelos crimes de peculato de uso e abuso de poder, previstos nos artigos 363.º e 374.º do Código Penal” e exigência de devolução dos “valores ganhos indevidamente”.
Manuel Ribeiro, Alberto Seixas e Eduardo Nvovi são alvos de um processo de sindicância, instaurado pelo Conselho Fiscal em Dezembro do ano passado, após queixa apresentada por quatro vogais do Conselho Directivo. Eduardo Nvovi (um dos visados pela sindicância), Anabela Almeida, Isabel Almeida e Cristina Silvestre.
Nvovi foi exonerado a 7 de Novembro por Manuel Ribeiro, num acto considerado “nulo” por “violação das regras elementares sobre colegialidade e democraticidade dos órgãos das associações”, como refere o relatório final do processo de sindicância, datado de 24 de Janeiro.
O processo de sindicância justifica a proposta de perda de mandato do presidente, Manuel Ribeiro, com a “prática de ilegalidades, como a usurpação de poderes do Conselho Directivo” e “violação das regras de gestão financeira“, a “realização e benefício de despesas sem prévio cabimento e compromisso financeiro“. O relatório final recomenda ainda o envio do relatório ao Ministério Público para a sua responsabilização penal.
Comissão de gestão
O relatório final da sindicância propõe também a perda de mandato do vice-presidente e do vogal-secretário Eduardo Nvovi, bem como a dissolução deste ou de todos os órgãos sociais, eleitos a 26 de Março de 2021 para um mandato de três anos, que em circunstâncias normais terminaria em Março de 2024. Recomenda ainda a nomeação de uma comissão de gestão, composta por três associados, para um período máximo de 90 dias e a convocação de novas eleições.
O Expansão tentou ouvir Manuel Ribeiro e Alberto Seixas, mas ambos declinaram pelo processo estar em curso. O presidente do Conselho Directivo manifestou-se disponível para falar no “tempo certo” e o vice-presidente disse, numa resposta por Whatsapp, que “se calhar outra pessoa estaria em melhores condições” para falar, escusando-se a nomear quem. Já o presidente da Assembleia Geral, Tomás Faria, não respondeu às mensagens, nem a um conjunto de questões enviadas sobre a tramitação do processo.
Tentativas de obstrução à sindicância
No relatório final do processo de sindicância – um documento de 21 páginas tornado público, no dia 28 de Janeiro, em Assembleia Geral a que o Expansão teve acesso – constam irregularidades no recrutamento de pessoas, exoneração de elementos do Conselho Directivo “em violação das regras”, assédio moral a colaboradores, ausência de relatório de gestão, despesas de viagens dos membros do Conselho Directivo, sem autorização, além de tentativas de obstrução à sindicância.
Um ambiente de desordem numa organização que tem a incumbência de pôr em ordem as contas das empresas e de outros organismos, como resume o jornalista e economista Carlos Rosado de Carvalho, no seu espaço “Economia 100 Makas”, na Rádio MFM.
Enriquecimento ilícito
O processo de sindicância, instaurado pelo Despacho n.º 001/22 de 14 de Dezembro, concluiu que o presidente e o vice-presidente usurparam os poderes e praticaram actos de improbidade pública, que “conduzem ao enriquecimento ilícito”, “excedendo os justos limites no exercício do mandato” e que capturaram os “poderes da colegialidade” ao tomar decisões sem a aprovação de todos os membros do Conselho Fiscal.
Com mais de 13 mil associados, 5.559 membros e 8.311 estagiários, a OCPCA é uma das maiores organizações profissionais de Angola, gerindo um orçamento anual superior a mil milhões Kz.
A receita prevista na proposta de Orçamento para 2023 supera 1,2 mil milhões Kz, 933 milhões Kz de receitas correntes e 289,7 milhões Kz que correspondem a 24% de atrasados que a Ordem espera recuperar em 2023.
Quanto às receitas correntes, mais de 368 milhões Kz vêm das quotas dos associados, 485 milhões são gerados pela formação inicial, ou seja, os estágios em ambiente controlado que preparam os candidatos para o exame de acesso à OCPCA, e 78,9 milhões Kz são arrecadados com a formação contínua. Só de quotas dos seus 13.650 inscritos, a ordem totaliza uma receita mensal fixa de 30,7 milhões Kz, valor que atesta a grandeza da organização.
Expansão