A desvalorização é uma doença crónica da moeda nacional já que desde 2000 o kwanza apenas valorizou cinco vezes face ao dólar, tendo desvalorizado 18 vezes face à moeda norte-americana, num ciclo em que apenas por três vezes a inflação esteve abaixo dos dois dígitos, segundo cálculos do Expansão. Nunca o kwanza valeu tão pouco.
Só este ano, o kwanza depreciou quase 40% face ao dólar, tratando-se daquela que é a quinta maior desvalorização desde 2000. Se não forem contabilizados os anos ainda em guerra civil (2000, 2001 e 2022), esta foi a segunda maior desvalorização do kwanza, apenas superada em 2018, quando o Governo mudou o regime cambial de flexível para flutuante.
Só aí, o dólar passou de 165,9 Kz no final de 2017 para 308,6 Kz a 31 de Dezembro de 2018. Por outro lado, desde 2007 que o Kwanza não apreciava durante um ano como aconteceu em 2021 e 2022.
Só que para muitos analistas esta apreciação aconteceu de forma artificial, com o Tesouro a canalizar para o mercado cambial uma boa parte das receitas fiscais com a alta de preços do petróleo, naquilo que entendem ter sido a preparação das eleições, de forma a potenciar as importações para baixar os preços dos bens de consumo.
E, por isso, o País pagou essa factura este ano, uma vez que já se sabia que o serviço da dívida iria aumentar devido ao reatamento do pagamento de dívidas à China e aos países do G20, que nos tinham dado moratórias no tempo da Covid-19. É por isso que a desvalorização do kwanza verificada este ano é diferente das outras, já que não resulta essencialmente de uma queda acentuada do preço do barril de petróleo.
Apesar dos preços de venda terem baixado da média de 100 USD de 2022, ainda assim mantiveram-se acima dos 75 USD que o Governo inscreveu no OGE.
Em 2023, ocorreram também várias paragens nos principais blocos petrolíferos do País para manutenção, algumas delas programadas e outras nem por isso, o que acabou por afectar a receita fiscal, ainda que de forma ligeira. Pelo que a desvalorização da moeda nacional teve como causa não a escassez de divisas a entrar no País, mas sim o aumento do fluxo de saída destas, para pagamento de dívida.
Como estavam a sair mais divisas do que a entrar, já que o Tesouro Nacional acabou por retirar-se do mercado cambial, isto acabou por mexer com o mercado cambial. Com menos oferta de divisas, os intervenientes do mercado, os bancos, não conseguiam preencher as suas necessidades, e acabaram a fazer licitações nos leilões de câmbio, algumas delas de facto especulativas, o que acabou por afundar o valor do kwanza face às principais moedas estrangeiras.
Até que o BNA, embora não o admita, pôs fim à flexibilização do mercado cambial, numa receita que não é nova em Angola, assegurando uma aparente estabilização do Kwanza desde finais de Julho. Assim, passaram 23 anos e a economia angolana continua agarrada às mesmas dificuldades de sempre: um País altamente vocacionada para as importações e com uma inevitável petrodependência que garante o financiamento de uma boa parte dos Orçamentos Gerais do Estado e o volume de divisas que entram no País.
Uma vez que a principal fonte de divisas resulta de um mercado tão volátil e em que são as dinâmicas nos mercados externos que definem os preços, não tendo Angola qualquer controlo sobre o preço, faz com que o mercado cambial no País seja também ele altamente volátil e sempre na “corda bamba”.
A economia angolana sofre, assim, de uma doença crónica, que o economês designa como “doença holandesa”, que se refere ao facto de a exportação de recursos naturais de um país acabar por prejudicar os outros sectores de actividade económica.
Durante muitos anos, Angola concentrou os seus esforços na exploração e exportação de petróleo, o que acabou por desequilibrar a economia, uma vez que a receita da indústria petrolífera acabou por valorizar o kwanza, tornando as outras exportações menos atraentes. Com isto, sectores como a agricultura e a indústria foram negligenciados, o que deixou o País vulnerável a flutuações do preço do barril de petróleo. E agora está a pagar a factura.
Expansão